Em fevereiro de 2011, o empresário francês Thierry Teyssier promete inaugurar em Paraty, o quarto endereço de um dos empreendimentos mais luxuosos da nova hotelaria, o Maisons des Rêves. A ideia da rede não é ser suntuosa, mas permitir ao hóspede a realização de sonhos — seja ficar num oásis no meio do Saara (1650 euros por noite, o casal) ou passar uma temporada no centro da cidadezinha histórica fluminense em casas cuja pintura poderá ser alterada, a gosto do cliente, a cada estada.

Quinta da Romaneira, Portugal
Teyssier criou o conceito de realizar “o que o hóspede quiser, na hora em que quiser” depois de uma experiência frustrada no Copacabana Palace, onde desejava hospedar-se desde criança. Ele foi impedido de tomar café da manhã na varanda, mesmo sob o sol carioca, porque o serviço ainda não havia começado. Acabou tomando café no salão com ar-condicionado.
Fonte: Revista Veja São Paulo – SP
Editoria: Especial Luxo
Data: Novembro 2010
Thierry Teyssier, o encenador de sonhos
Foi num dos seus hotéis – ou “Maisons des Rêves”, como gosta de chamá-los e são conhecidos como marca registada –, que conheci Thierry Teyssier, um francês com família de origem holandesa de Java, e um homem que faz questão em transformar os seus sonhos em realidade. Atrevo-me a acrescentar que os faz com o maior êxito, proporcionando, a quem neles se instala, a realização dos seus próprios momentos de sonho.

Thierry Teyssier
Voltando um pouco atrás na história e, como boa sonhadora, confesso que há anos sonhava em conhecer o primeiro hotel que Thierry fez, o Dar Ahlam, em Ouarzazate, Marrocos. Sonhei depois ficar na segunda “casa dos sonhos” que Thierry idealizou, o Khia Ahlam, um acampamento nómada nas dunas do Sahara. De repente, em menos de um ano, vi estes meus dois sonhos quase a concretizarem-se mas, por duas vezes, e por compromissos já agendados, acordei antes de os realizar.
Como acredito no Destino e nos provérbios populares, em que “não há duas sem três”, não tenho a menor dúvida que, na próxima, verei então “the dreams that I dare to dream, really do come true”… e não precisa de ser “Somewhere Over the rainbow”, basta tal e qual como Thierry os encena que por mim já me dou por satisfeita.
Como, além do Destino, acredito no Acaso onde nada é por acaso, estava então escrito que antes de sonhar acordada numa das Maisons des Rêves de Thierry Teyssier, lá no sul em Marrocos, teria de conhecer o próprio encenador dos sonhos, talvez para entender melhor o seu significado.
Encontrei, assim, Thierry Teyssier em Portugal, a sua última criação e, já agora porque não confessar, também um local de sonho que gostaria de conhecer: a Romaneira, no coração do Douro, numa paisagem de cortar a respiração, entre socalcos e declives, num refúgio longe da multidão, onde Thierry, de uma quinta tradicional portuguesa, no coração de uma propriedade com 400 hectares, reinventou e recriou um lugar único… de sonho, claro!
Em criança Thierry tinha o sonho de conhecer o Copacabana Palace. Cresceu com a imagem daquele mítico hotel, a imponente e velha dama de Copacabana, que continua a encantar não se deixando nunca abalar por nenhuma garota de Ipanema, desde a sua fundação em 1923.
E, há 10 anos atrás, depois de deixar Paris num dia chuvoso do Inverno europeu, Thierry realizou finalmente o seu sonho de criança e chegou ao “seu” desejado Copacabana Palace. Seis da manhã, sol já alto, calor tropical, um dia com luz radiosa e o seu hotel de sonho… Thierry queria usufruir de tão magnífico cenário e, ali na piscina que era então só dele, pediu que lhe servissem o pequeno-almoço. Mas nem tudo é como se sonha ou imagina – pelo menos neste momento – ,e o seu pedido foi-lhe negado porque não estava ainda na hora de se servir o dito café-da-manhã. E, assim, o seu sonho de criança do Copacabana Palace desfez-se à amarga e dura velocidade do som da palavra não…
Resolveu então criar outro, o seu! Fazer um hotel para dar aso aos seus sonhos, em cenários únicos, onde qualquer um pudesse viver em liberdade e exclusividade sem horários marcados, onde quem decide o tempo é o hóspede e não o Tempo.
Proprietário de uma Agência de comunicação e eventos em Paris, a Lever de Rideau, e anteriormente Director de uma companhia de Teatro, aventurou-se então na área da hotelaria. Thierry descobriu o seu paraíso perto de Ouarzazate, em Marrocos, num velho e belíssimo kasbah de adobe, no meio de um oásis, lá bem no sul onde a terra acaba e o deserto começa. O cenário era o ideal, um local longe de tudo, onde a história, cultura, gastronomia e paisagem eram propícias à criação do seu Jardim do Eden.
Levou cerca de dois anos a reconstruí-lo: minuciosamente, tal como era, dotando-o apenas de todo o conforto que um viajante da era actual exige; misturando depois o seu percurso e experiências professionais; juntando-lhe ainda o espírito cénico e a sua alma imaginativa e sonhadora. Criou, então, a sua primeira casa de sonhos, o Dar Ahlam, que em árabe significa isso mesmo: Casa dos Sonhos. Um lugar que o jornal britânico The Guardian considerou um dos dez retiros mais românticos do mundo.

Dar Ahlam, Marrocos
Ainda em Marrocos, mas em pleno deserto, cria posteriormente o Dar Ahlam nomade, ou Khia Ahlam, o nome só por si uma viagem, casa dos sonhos nómada, um acampamento formado por até 5 tendas instaladas a pedido algures nas dunas do deserto do Sahara. Depois, e tal como já lhe tinha acontecido em Marrocos, Thierry descobriu o Douro rendendo-se aos encantos desta paisagem. Apaixonou-se pela região, Património Mundial da Humanidade, recriando a Quinta da Romaneira, tendo como pontos comuns em todas as suas Maisons des Rêves o intuito de oferecer aos hóspedes um serviço totalmente personalizado, que vai muito além das vulgares cinco estrelas dos hotéis.

Khia Ahlam, Marrocos
As suas próximas aventuras são em Paraty (no Brasil) onde já comprou um pequeno sobrado no meio de centro histórico, e a abertura para breve de uma boutique em Paris, onde estarão à venda produtos e ameneties dos seus hotéis… verdadeiramente divinos! As suas Maisons de Rêves, mais do que hotéis, são casas com alma, cheias de objectos por ele resgatados por esse mundo fora, carregados de recordações, culturas, tradições e estórias. Thierry fala de momentos de vida e não de decoração: para ele as peças têm que ter uma história, têm que ter alma. Só assim fazem sentido!
Em todas elas Thierry cria atmosferas envolventes em cenários idílicos, como caminhos iluminados por centenas de velas; açoteias que parecem ter o céu estrelado como tecto enfeitadas com tapetes e almofadas voluptuosas; quartos que nos transportam em viagens longínquas, para lugares remotos ou ambientes langorosos; velas com cheiros inusitados e inebriantes, que se estendem ao longo das divisões; almoços num relvado entre voiles esvoaçantes, nas margens de um curso de água ou no coração das vinhas; piqueniques nos socalcos do Douro; chá de menta ao pôr-do-sol nas dunas do deserto mais mágico do mundo ou num campo de amendoeiras em flor; jantar sob o céu estrelado… cada refeição é servida num local isolado, só nosso. Lugares diferentes para todas as refeições de sabores inesquecíveis, que não se repetem duas vezes no mesmo local. Tudo muda, tal como as cenas de teatro. São momentos de vida, não uma noite, não um fim de-semana, não uns dias de férias.
O pequeno-almoço, o almoço ou o jantar, não são simples e deliciosas refeições, mas sim um conceito. Na descoberta de locais inesperados, de sabores inesquecíveis, com decorações efémeras, que surgem e desaparecem como a mudança de um cenário teatral… ou como um sonho. Tudo é encenado para recrear pequenos jardins secretos, recantos íntimos onde nada está por acaso, onde tudo se vai revelando em momentos suspensos para guardarmos para sempre nas nossas memórias.
Thierry não faz nada sem paixão nem exigência e isso está patente à nossa vista… e em todos os nossos sentidos. Numa das nossas conversas, Thierry citou uma máxima de Leonardo da Vinci: “os detalhes fazem a perfeição, mas a perfeição não é um detalhe.” Talvez por isso mesmo Thierry não seja um hoteleiro comum; ou, por outra, quem sabe, não seja o pioneiro de uma nova geração de hoteleiros, onde o bom gosto, o luxo simples, a gastronomia divina, a paz, o silêncio, a privacidade, a exclusividade e um apelo a todos os sentidos façam parte do conceito da nova hotelaria. E, se depois de tudo isto, ainda temos o direito de sonhar acordados, que mais se pode desejar? No mínimo, vários sonhos recorrentes! pelo menos… é esse o meu desejo!
Texto: Maria João Pavão Serra